Regressão Integrativa: Recordar num mundo de esquecimento




Nossos dramas atuais são ressurgências muito antigas, velhos dilemas assumindo novas roupagens, tal qual padrões malquistos que se repetem. Nossos males em sua gênese são os mesmos de nossos antepassados: o “lamento dos mortos”, como diria Jung. A não ser que cheguemos a um termo de conciliação com eles, não obtemos paz de espírito. Parece ser nossa tarefa curar a nossa ancestralidade, mergulhar nas profundezas de nós mesmos e honrar as nossas raízes de corpo e alma.

Em certo sentido, portanto, o que consideramos como mal-estar contemporâneo é uma herança com novidade. Um espectro de ocorrências de um mal ancestral tão ou mais arcaico do que a própria humanidade e circunscrito no espaço-tempo e mais além, também tangível na mitologia ou numa genealogia histórica onde a ontologia do ser simplesmente recapitula a filogenia e a cosmogonia. Ou seja, do vácuo quântico ao big-bang, ao mineral, vegetal, animal, humano e sua transcendência...

Na verdade, são tão somente aqueles mesmos velhos conflitos de outrora, divisões e fragmentações subexistenciais, agora travestidos de novas circunstâncias que se sobrepõem. Ou seja, nossos problemas não estão somente lá fora, embora esse lá fora os interceda e os refaça. Não são só epocais, nem somente inseridos numa cultura, embora isso possa sim os paramentar e reprisar. É que algo consubstancial ou arquetípico persiste lá no fundo, em nosso íntimo, atravessando os tempos. E carregamos conosco sem saber as causas, ordinariamente e de modo polarizado.

Hábitos recidivos, repressões, traumas e condicionamentos enraizados, “emoções que enterradas vivas”, como dizia Freud, “voltam das piores formas”, ainda mais quando sobrevêm junto a crenças subliminares limitantes, mandatos nocivos e que nos fazem manifestar uma carga densa que se repete, nossas zonas anestesiadas, as neuroses nossas de cada dia, quando não psicoses, enfim... Doenças da alma.

Sabe-se que tanto pílulas, quanto palavras podem aliviar sintomas. Mas se mais do que alívio, aspirarmos também uma mudança interior, ou transformação, o que dizer então das causas de nossos bloqueios?

É verdade que podemos meditar, sair do tempo, e fazemos bem em exercitar essa presença na quietude, esse esvaziamento. Mas quando voltamos à ação, alguns dilemas simplesmente persistem... Apenas contemplar um bloqueio não o desfaz, não o dissolve. O problema do mal, a dialética existencial, a cisão entre razão e emoção, em grande parte, tudo ainda está ali... Persiste. A contemplação do meditante pode suspender essa dissociação, esvaziá-la numa amplitude iluminada, mas, e como desbloqueá-la em sua especificidade ou manejá-la fora do ambiente retirante? Como consciencializá-la e transmudá-la para enfrentar a vida mais dignamente?

Ocorre que dilemas tão antigos, nossos velhos dramas humanos ou males abissais, carecem de uma abordagem onde seja possível rastreá-los em nosso inconsciente, tirá-los do ocultamento das sombras e trazê-los à luz de uma consciência sempre presente, mais integrativa e excelsa. Assim, além de esvaziar-nos no meditar, é preciso também enraizamento, sondar as profundezas do inconsciente para desbloquear, curar, regenerar, reprogramar e integrar as nossas partes condoídas, divididas e fragmentadas.

É nesse vetor existencial e transpessoal que podemos despertar para aperfeiçoar uma inteligência sutil capaz de combinar coração-intelecto e que nos ajude a recordar num mundo de esquecimento. E, então, ativar lá, desde o nosso íntimo, no mais profundo de nós mesmos, a sabedoria transfigurativa do amor como força motriz de nossa evolução individual e coletiva.

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