O impostor científico

 

O impostor científico nem sempre se vê como uma farsa, na maior parte das vezes ele acredita mesmo na sua própria impostura que pode ser resumida na seguinte incongruência: Aquilo que ele não conhece não existe. O que ele acha que conhece é universal e deve ser imposto a todos. Ainda mais se concluir junto a seus pares,  a fim de atender a quem investe pesado para obter determinada ordem de resultados, que seu séquito detém a melhor evidência disponível.

E é assim que a ciência se converte em cientificismo, pela “morte do sujeito” que não reconhece a influência inexorável de suas inferências sobre seu objeto de pesquisa, adotando uma falácia de universalidade tão tola, quanto perigosa, e que corrompe a divulgação científica e a subverte num mero dispositivo autoritário de persuasão ou coerção coletiva.

O cientificismo é uma ideologia sobre o poder explicativo e interventivo da ciência e não sobre a práxis da Ciência em si, muito menos sobre sua reflexão ética e epistemológica e que deveria reconhecer a interagência entre o sujeito e seu objeto de pesquisa, bem como, as fronteiras da técnica e suas limitações. Como se sabe, ou ao menos deveria se saber, todo o conhecimento válido se produz na relação entre sujeito e objeto, e a NEGAÇÃO de um desses polos redunda em falsos conhecimentos ou em artificialidades.

Ocorre que essa postura de negação da própria influência (ou falsa neutralidade) que incita o pretenso "discurso de autoridade" ou "pretensão de absolutismo" pode inclusive ser projetada melindrosamente nos outros, acusando-os de negacionistas, afinal, decorre de um mecanismo psicológico disfuncional (ou dissonância cognitiva, ilusão de separação, negação da própria subjetividade), e por isso mesmo, agravante de discórdias sociais onde tudo se complica, pois traços psicopatológicos bastante comuns nas pessoas em geral, como a síndrome de pequena autoridade, podem tornar o debate científico uma disputa pedante entre Napoleões de hospício, cada um mais convicto do que o outro a respeito de sua própria "supremacia". Afinal, parodiando conhecido dito popular, talvez “de médico, DITADOR e louco todo mundo tenha um pouco”.

“A ciência, portanto, pode ser uma defesa. Basicamente, ela pode ser uma filosofia de segurança, um sistema de proteção, um modo complexo de evitar a ansiedade e os problemas que nos afligem (especialmente se ligados a questões éticas). Levada a extremos, pode ser uma maneira de evitar a vida, uma espécie de enclausuramento intencional. Nas mãos de certas pessoas, pode tornar-se, (...) uma instituição social com funções basicamente defensivas e ortodoxas, muito mais voltada para a regulamentação e estabilização do que para a descoberta e renovação.” (Abraham Maslow)

No fim das contas, sem recair em extremismos, a ciência genuína deveria ser muito mais um convite a se fazer parte de uma determinada comunidade de verificação e suas coordenações de ações do que um conhecimento supremo que possua qualquer legitimidade para se impor algo a alguém, muito menos, algo que possa ser utilizado como discurso para violar direitos e a dignidade humana. Quem recai nisso, como a história ensina, pode estar cometendo graves crimes contra a humanidade... Os eugenistas e seus simpatizantes que o digam. Mas será que aprenderam? Ou impostores que são, apenas vêm mudando seu disfarce? 

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